Washington Paranhos, SJ
O Tempo Pascal é aquele período do ano litúrgico em que, “a partir do Tríduo Pascal, como fonte de luz”, a Páscoa do Senhor é celebrada como em “um único dia de festa”. Sua conclusão é a Solenidade de Pentecostes. Dura cinquenta dias, sete vezes sete dias, uma semana de semanas com um amanhã, e o número sete é uma imagem de plenitude (pense no relato da criação no primeiro capítulo de Gênesis), a unidade que é adicionada a essa plenitude multiplicada se abre para uma vida após a morte. Assim, o tempo pascal, com a alegria prolongada do triunfo pascal, tornou-se para os Padres da Igreja a imagem da eternidade e da realização do mistério de Cristo. Para Tertuliano, no final do século II, o quinquagésimo pascal é o tempo de grande regozijo, durante o qual se celebra a fase gloriosa do mistério da redenção após a ressurreição de Cristo, até à efusão do Espírito sobre os discípulos e sobre toda a Igreja nascida da Paixão de Cristo. Qualifica-se como um tempo de exultação pela vitória de Cristo sobre a morte e pela nova vida dos crentes em Cristo.
O tempo pascal é considerado como o laetissimum spatium, expressão cara a Tertuliano, espaço de imensa e intensa alegria, por causa da promessa cumprida pelo Senhor: “Eis que estou convosco todos os dias, até o fim dos tempos” (Mt 28, 20). Ao que um único dia é curto demais para celebrar, a Igreja consagra cinquenta dias, que são uma extensão da alegria pascal; o jejum sempre foi banido nesta época, mesmo pelos mais austeros dos ascetas. Os cinquenta dias são como um único domingo.
Na oração da Coleta do quarto domingo, a Igreja reza: “Deus eterno e todo-poderoso, conduzi-nos à comunhão das alegrias celestes, para que a fragilidade do rebanho chegue onde a precedeu a fortaleza do pastor, Jesus Cristo”. Esse espírito comemorativo, portanto, exige que não baixemos a guarda com o passar das semanas. Os cinquenta dias são como um domingo! Alegria, ação de graças, celebração da vida e da luz.
A oitava da Páscoa tem um caráter mais pronunciado de regozijo e meditação sobre o fato da ressurreição de Cristo e o nascimento do cristão no batismo, que é uma participação na vida ressuscitada de Cristo, através de um novo nascimento e um penhor da ressurreição futura. Mas o conjunto dos cinquenta dias tem mais ou menos esse caráter: o Aleluia é cantado continuamente. O mistério do Tempo Pascal tem as suas raízes na especial presença do Senhor ressuscitado. De fato, lemos nos Atos dos Apóstolos: “Depois da sua paixão, Jesus mostrou-se vivo a eles com numerosas provas. Apareceu-lhes, por um período de quarenta dias, falando do Reino de Deus” (At 1,3). É esta presença única do Ressuscitado que a Igreja celebra atualizando-a no tempo pascal, presença que enche de alegria o coração dos discípulos. O círio pascal que brilha diante da assembleia litúrgica exprime simbolicamente a luz do Ressuscitado que ilumina a sua Igreja.
O encontro com o Ressuscitado traz paz e alegria. Assim como os discípulos “se alegraram ao ver o Senhor”, também a Igreja se alegra com o encontro místico-sacramental com o Senhor ressuscitado durante o tempo pascal. A razão da alegria pascal e da paz interior provém da fé na ressurreição do Senhor e da sua presença contínua no meio de nós, mas também do fato de, através dos sacramentos pascais, termos ressuscitado com Ele para uma vida nova e imortal. A alegria pascal que permeia todo o tempo pascal manifesta-se pelo canto do Aleluia, o cântico da Igreja em festa. Nunca antes foi tão frequente e solene como neste período.
Este tempo é profundamente marcado por três solenidades: Páscoa, Ascensão e Pentecostes. A Páscoa marca a entrada do Cristo glorioso na vida de Deus. Mas a Páscoa de Cristo torna-se também nossa: a vida do Ressuscitado entra com força na nossa vida e transforma-a; dessa forma, já carregamos a vida eterna dentro de nós. Para Cristo, a Ascensão marca o ápice do grande movimento de exaltação com que Deus coroa o seu aviltamento por nós, até à morte na cruz.
O Pentecostes, realização da única grande celebração pascal, celebra a efusão sobre a Igreja do Espírito do Ressuscitado, que nos faz diante do mundo testemunhas da ressurreição e capazes de vida nova. Uma vida que se deixa guiar pela fé e estimulada pelas exigências da caridade, uma vida livre que supera toda a tristeza do mal com o Aleluia Pascal.
Os textos eucológicos (coletas, prefácios, etc.) e o lecionário realçam algumas das características próprias deste tempo: o tempo de Cristo, do Espírito. Nisto a centralidade do mistério de Cristo crucificado e ressuscitado é evidente pelo próprio fato de que “nosso cordeiro pascal, Cristo, foi imolado” (1Cor 5,7). Ele agora substitui o cordeiro do Antigo Testamento: “Ele é o verdadeiro cordeiro, que tirou o pecado do mundo; morrendo destruiu a nossa morte e, ressurgindo, restaurou a vida” (Prefácio da Páscoa I). A restauração através do Mistério Pascal é também um elemento cristológico que encontramos nos formulários: “Pois, destruído o que era velho, toda a criação decaída é renovada e em Cristo nos foi recuperada a integridade da vida” (Prefácio da Páscoa IV).
Em Cristo, ressuscitado dos mortos, a vida do homem e do mundo dá um salto qualitativo. O tempo pascal é um tempo privilegiado para a mistagogia: “a comunidade unida aos neófitos, quer pela meditação do Evangelho e pela participação da Eucaristia, quer pela prática da caridade, vai progredindo no conhecimento mais profundo do mistério pascal e na sua vivência cada vez maior” (RCIA, n. 37).
Neste tempo pascal podemos vislumbrar uma correspondência entre a Páscoa de Cristo e a nossa Páscoa. A fonte e a rocha da nossa fé é o mistério do Senhor Crucificado-Ressuscitado, que partilhou conosco por meio dos sacramentos da Iniciação Cristã. Cada um dos Domingos de Páscoa deve ser para as assembleias uma forte experiência de vida, de fé e de comunhão eclesial vivida. Em tudo isso, ajuda consideravelmente, o livro guia: os Atos dos Apóstolos. Este é o tempo da grande experiência do mistério da Igreja na alegria do encontro sacramental com o Ressuscitado.
É preciso educar os fiéis para que compreendam que celebramos e encontramos Cristo que morreu, foi sepultado e ressuscitou na sua totalidade e sacramentalmente na Eucaristia dominical, juntamente com os nossos irmãos e irmãs. O tempo litúrgico da Páscoa envolve com zelo protetor o tempo do homem, o nosso tempo, tempo marcado por tantas desigualdades, guerras, sofrimentos, fome e miséria, para que não se perca a confiança, não se enfraqueça a esperança e não se esqueça a caridade.
E a esperança para nós, cristãos, tem um nome: chama-se Jesus. É o Ressuscitado que nos permite passar pelas dificuldades sem ceder ao desânimo, como aconteceu com os dois discípulos no caminho de Emaús.
Washington Paranhos, SJ é professor e pesquisador no departamento de Teologia da FAJE