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Sem atuação das mulheres não haverá Igreja sinodal

Élio Gasda SJ

No dia 25 de maio, na Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia, acontecerá a RODA DE CONVERSA: IDENTIDADE E PRESENÇA DA PESSOA LGBTQIA+ E DA MULHER NAS COMUNIDADES CRISTÃS.

Organizado pelo Grupo de Pesquisa Diversidade Afetivo-sexual e Teologia, o evento tem por objetivo apresentar leituras interdisciplinares e ecumênicas sobre a identidade, presença e silenciamentos das pessoas LGBTQIA+ e a das mulheres nas comunidades cristãs.

Em relação ao protagonismo da presença feminina há uma lacuna preocupante. A luta por respeito e equidade é permanente em todos os setores, na política, nas artes, nas ciências, na religião.

Em uma Igreja governada por homens é preciso conversar sobre o lugar da mulher. Apesar de resistências, em diversas comunidades cristãs as mulheres começam a marcar presença em órgãos como conselhos pastorais comunitários e paroquiais e arquidiocesanos. Mesmo nos poucos espaços de decisão, elas enfrentam homens que as calam e ignoram seu papel. Presenças silenciadas? Visibilidades sem voz? Não é fácil falar desse papel na Igreja.

As mulheres têm sido destacadas no pontificado do Papa Francisco justamente porque a hierarquia é dominada por homens. Não se trata de reivindicar espaços de poder em uma estrutura piramidal anacrônica. Durante séculos o clero masculino excluiu as mulheres da dignidade de serem imagem de Deus, legitimando relações de submissão sobre elas. E demonizou o corpo feminino para controlar sua sexualidade.

Abordar a identidade e presença da mulher para reconstruir relações de justiça e irmandade. Hierarquias e desigualdades não fazem parte do Evangelho. O Reino de Deus se expressa em novas relações de gênero, como o protagonismo das mulheres discípulas de Jesus. “Maria […] na santa Igreja ocupa depois de Cristo o lugar mais elevado e também o mais próximo de nós” (Lumen gentium, 54). Uma mulher, a primeira a anunciar a Ressurreição do Crucificado.

Vozes femininas no coração do Evangelho! As mulheres podem despatriarcalizar a imagem de Deus que legitima as estruturas misóginas na igreja. A imagem de um Deus pai/mãe pode ressignificar as relações humanas mais recíprocas.

Francisco, que inseriu a sinodalidade como caminho da vida da Igreja, disse que “caminhar juntos – laicato, pastores, Bispo de Roma – é um conceito fácil de exprimir em palavras, mas não é fácil pô-lo em prática”. E continuou: “Se compreendermos que, como diz São João Crisóstomo, ‘Igreja e Sínodo são sinônimos’, entenderemos que dentro dela ninguém pode ser ‘elevado’ acima dos outros”.

Muitas mulheres já exerciam função de leitoras e acólitas. Contudo, foi em janeiro último que Francisco assinou decreto autorizando mulheres a atuarem nas chamadas “ordens menores”. Antes, para exercer a função, elas dependiam de autorização do bispo.

Aguarda-se com ansiedade a participação de Nathalie Becquart no Sínodo dos Bispos, previsto para outubro/22. Talvez ela seja a primeira mulher com direito a voto em um Sínodo. Talvez. Nomeada pelo papa como subsecretária, cargo com direito a voto, até então ocupado por homens.

Para conversar sobre a presença da mulher na Igreja é preciso conhecer o papel que elas assumem na sociedade. São jovens, trabalhadoras, desempregadas, estudantes, muitas são mães, tem filhos LGBTQI+, negros, brancos, são migrantes, detentos, etc. Muitas são mãe solo, administram a casa, gerenciam empresa. Entretanto, homens agarrados a uma bíblia julgam e determinam direitos e deveres delas. Reduzidas ao silêncio, mulheres continuam ofendidas pelos próprios cristãos.

Padres Sinodais que não estão preparados para discutir sobre família, sexualidade, filhos, aborto, insistirão em deixá-las nos últimos bancos? Sem as mulheres, os bancos estariam vazios e as igrejas desertas. Em diversas comunidades, as mulheres são chamadas apenas para a limpeza das casas paroquiais e dos templos, para lavar a roupa do padre, para as secretarias dos escritórios paroquiais e para o serviço social. Ainda são homens os que decidem como as mulheres podem viver sua fé.

As atitudes das comunidades cristãs contribuem para a manutenção da misoginia e injustiça de gênero na sociedade. A maioria dos batizados é mulher. Porque o papa é eleito apenas por votos masculinos? Porque uma mulher não pode ser reitora de uma universidade católica? São muitos porquês.

A capacidade de tomar a palavra é fundamental. O que está em jogo é a transição para uma Igreja mais equitativa e justa. Manter as mulheres à distância era um marco do catolicismo medieval.

Enquanto as mulheres estiverem relegadas ao ‘último banco’ (Lucetta Scaraffia), não haverá sinodalidade. A porta de saída da igreja está logo ali, atrás do ‘último banco’. Cansadas de serem tratadas como cristãs de segunda categoria, muitas mulheres já foram embora. Elas, que podem derrotar o clericalismo.

Que as comunidades cristãs deixem de ser portadoras do vírus da misoginia. Ou a Igreja a enfrenta ou é parte do problema.

Que o processo sinodal recupere a harmonia das relações entre homem e mulher. Que elas sejam integradas de maneira definitiva nos ministérios e órgãos de decisão. Está em jogo a identidade de toda a Igreja. Essa é a questão mais importante.

Élio Gasda SJ é professor e pesquisador no departamento de Teologia da FAJE

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