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Constituição Apostólica “Praedicate Evangelium”

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Washington Paranhos SJ

O Papa Francisco promulgou a nova constituição apostólica “Praedicate Evangelium”. Entre as inovações mais relevantes, estão a instituição dos Dicastérios para a Evangelização e para o Serviço da Caridade; a Secretaria de Estado torna-se “Secretariado Papal”, e leigos e leigas poderão presidir um Dicastério.

Uma Cúria Romana cada vez mais missionária, ao serviço das Igrejas particulares com vista à sinodalidade e à “sã descentralização”. Este é o retrato que emerge da Constituição Apostólica Praedicate Evangelium sobre a Cúria Romana e o seu serviço à Igreja no mundo, promulgada pelo Papa em 19 de março, Solenidade de São José, e que entrará em vigor a partir de 5 de junho, Solenidade de Pentecostes. Com a entrada em vigor da Constituição Apostólica, a Constituição Apostólica Pastor Bonus, de João Paulo II em 1988, é completamente revogada e substituída, e termina a reforma da Cúria Romana desejada por Francisco desde o início de seu pontificado – em pedido dos próprios Cardeais nas reuniões pré-conclave – e realizado em sinal de colegialidade e sinodalidade, através da contribuição do Conselho de Cardeais, que se reuniu periodicamente desde outubro de 2013 a fevereiro passado.

Se houver outras mudanças, o Papa as fará”, afirmou o Cardeal Marcello Semeraro, prefeito da Congregação das Causas dos Santos. De fato, foi o que aconteceu com Paulo VI e João Paulo II, autores das duas constituições Regimini Ecclesiae universae (1967) e Pastor Bonus (1988). Muitas mudanças isoladas, com Francisco, já haviam entrado em vigor, graças a Motu Proprio papais ou outras intervenções legislativas. Mas é certamente impressionante ver em preto no branco a nova estrutura, que reproduz um pouco aquela da Companhia de Jesus.

A reforma não é um fim em si mesma

A reforma da Cúria Romana será real e possível se brotar de uma reforma interior, com a qual fazemos nosso o paradigma da espiritualidade conciliar, expressa na antiga história do Bom Samaritano”, disse o Cardeal Semeraro, daquele homem que se desvia do seu caminho para fazer-se próximo de um homem meio morto que não pertence ao seu povo e que ele nem conhece.

Por isso, “o primeiro eco que a palavra ‘reforma’ suscita na alma de Francisco é uma reforma da própria vida” e “é muito mais do que qualquer mudança estrutural”. Com efeito, trata-se de agir de tal forma que a Igreja, até na passagem do tempo e nas mudanças da história, preserve a sua transparência (sacramentalidade) em relação ao plano de Deus, que a faz existir e nela habita.

Essa é a premissa em torno da qual se articula a nova Constituição, composta por 250 artigos em 11 capítulos. O princípio norteador é uma espiritualidade que tem sua fonte no amor de Deus que nos amou primeiro, quando ainda éramos pobres e pecadores, e que nos lembra que nosso dever é servir nossos irmãos e irmãs como Cristo, especialmente os mais necessitados e que o rosto de Cristo seja reconhecido no rosto de cada ser humano, especialmente do homem e da mulher que sofrem.

A reforma, portanto, na visão do Papa “não é um fim em si mesma, mas um meio para dar um forte testemunho cristão; promover uma evangelização mais eficaz; promover um espírito ecumênico mais fecundo; encorajar um diálogo mais construtivo com todos”, afirma o Cardeal Semeraro.

Menos dicastérios, abertura aos leigos

Era necessário reduzir o número de Dicastérios, combinando aqueles cuja finalidade era muito semelhante ou complementar, e racionalizar as suas funções com o objetivo de evitar sobreposições de competências e tornar o trabalho mais eficaz”, justifica a reforma, que abre aos leigos e às leigas. “Qualquer fiel pode presidir um Dicastério ou um Organismo, dada a particular competência, poder de governo e função deste último”, lemos de fato no texto, que fala também da necessidade de uma “sã descentralização”, na relação entre a Cúria e as Igrejas particulares.

Uma escolha clara das prioridades de governo. A isso se soma o fato de que leigos e mulheres poderão dirigir os departamentos do Vaticano, porque os leigos e as mulheres podem fazer a Igreja compreender os sinais dos tempos. E também cabe a eles serem missionários. Esta será a Igreja do futuro, a Igreja do Terceiro Milênio. Uma Igreja missionária, “em saída”. Não se pode deixar de sublinhar outro fato: a reforma foi realizada enquanto, sobretudo na frente conservadora, dentro e fora do Vaticano, havia quem há meses vinha ressaltando a lentidão do processo de finalização da nova estrutura.

Primeiro a evangelização

A criação de um Dicastério para a Evangelização chefiado pelo Papa – o primeiro da lista de Dicastérios, que reúne a Congregação para a Evangelização dos Povos e o Pontifício Conselho para a Promoção da Nova Evangelização – e de um Dicastério para o Serviço da caridade: estas são as inovações mais importantes da nova constituição, juntamente com a introdução de uma seção disciplinar no Dicastério para a Doutrina da Fé e o nascimento do Dicastério para a cultura e a educação.

A Cúria Romana será assim composta no total de 16 Dicastérios, além dos Órgãos de Justiça, os órgãos econômicos, três ofícios (Prefeitura da Casa Pontifícia, Ofício das celebrações litúrgicas do Sumo Pontífice, Camerlengo da Santa Igreja Romana), os Advogados e as instituições ligadas à Santa Sé. Além da Seção de Assuntos Gerais e da Seção de Relações com os Estados e Organismos Internacionais, a Secretaria de Estado – que agora se torna a “Secretaria papal” – pode contar com uma Seção para o corpo diplomático da Santa Sé.

A estrutura do Dicastério para a Evangelização é muito articulada, presidida “diretamente pelo Romano Pontífice” e governada por dois pró-prefeitos, um para cada seção do Dicastério: a primeira “para as questões fundamentais da evangelização no mundo”, também competente para a catequese; a segunda “para a primeira evangelização e as novas Igrejas particulares”, à qual são confiadas, entre outras coisas, as Pontifícias Obras Missionárias. A seção disciplinar do Dicastério para a Doutrina da Fé, através do Ofício Disciplinar, “ocupa-se dos crimes reservados ao Dicastério”, com as sanções conexas, e integra a Comissão para a proteção dos menores.

O serviço da caridade

O Dicastério para o Serviço da Caridade – ou Esmola Apostólica – é dirigido pelo Esmoleiro de Sua Santidade e “exerce em qualquer parte do mundo o trabalho de assistência e ajuda para com eles” em nome do Papa, que “nos casos de pobreza particular ou outra necessidade, organiza pessoalmente a ajuda a ser destinada”. Compete-lhe também “receber, buscar e solicitar doações livres destinadas às obras de caridade que o Romano Pontífice exerce para com os mais necessitados”.

O Dicastério de Cultura e Educação – fruto da unificação do Pontifício Conselho para a Cultura e da Congregação para a Educação Católica – tem duas seções respectivas: a Seção de Cultura, que “promove e estimula o diálogo entre as muitas culturas presentes no interior da Igreja”, e a Seção de Educação, que atende, entre outras coisas, às escolas católicas de todos as ordens e graus e promove o ensino da religião católica nas escolas.

Na Seção V sobre Dicastérios, quando fala do Dicastério para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos, no artigo 93 afirma: “O Dicastério se ocupa da regulação e disciplina da sagrada liturgia quanto à forma extraordinária do Rito Romano”.

Uma pequena observação

Observo apenas que o Motu Proprio Traditionis custodes de julho de 2021 também do Papa Francisco, não usa mais a expressão “forma extraordinária do Rito Romano”, mas fala de “formas anteriores à reforma desejada pelo Concílio Vaticano II”. Afirma também que os livros litúrgicos promulgados por Paulo VI e João Paulo II “são a única expressão da lex orandi do Rito Romano”.

Os redatores da Constituição Apostólica Praedicate Evangelium ressuscitaram uma linguagem que não é mais adequada, que corre o risco de perpetuar uma situação que Traditionis custodes modificou explicitamente.

Washington Paranhos SJ é professor e pesquisador no departamento de Teologia da FAJE

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