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Terceiro Passo: em uma atitude constante de discernimento

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Alfredo Sampaio Costa SJ

Passam os dias, os meses, viramos o ano e seguimos enfrentando as variantes de uma epidemia que insiste em permanecer entre nós. Vencidos muitas vezes pelo cansaço, dominados por sentimentos de impotência, lutamos contra o desânimo, atormentados pela tentação de encontrar respostas fáceis e rápidas. Contudo, o caminho a ser trilhado e a complexidade da situação que enfrentamos pedem paciência e resiliência. Um terceiro passo se nos impõe: prosseguir com a busca de respostas, sem nos contentar com imediatismos apressados.

Não podemos rezar sobre a pandemia sem ter presente diante de nossos olhos os rostos daqueles que sucumbiram, das famílias destroçadas pela dor. Ainda que isso nos custe e incomode, a oração cristã autêntica pressupõe uma relação viva com o Senhor, um “face a face”, de coração a coração. O que caracteriza a oração cristã em relação a outras formas de oração é essa dimensão de alteridade. Dom Luciano dizia que a oração é “vivência consciente da reciprocidade afetiva” (1) . A oração é o clima natural do discernimento (2) . Importa, pois, “povoar” nossa oração, não rezamos isolados do mundo.

Discernir com o olhar fixo em Jesus: Antes de mais nada, o Senhor deve ocupar o centro da nossa atenção na oração. O discernimento não só não deixa de lado a contemplação, mas ainda se alimenta dela, e a contemplação se faz com um caráter de discernimento (essa é uma das notas que caracteriza a contemplação inaciana frente a outros tipos de oração contemplativa). A mútua interação de contemplação e discernimento evita, além do mais, que este se converta em um ensimesmado dar volta em torno de nós mesmos. Qualquer decisão que tomemos, será movida pelo desejo de fazer algo por Cristo, respondendo existencialmente à tríplice interpelação dos Exercícios: “Que fiz, que faço, que farei por Cristo?” (EE 53, no colóquio diante do Crucificado, que é a primeira vez que Cristo é mencionado nos Exercícios).

Igualmente, no exercício essencial, fundamental e fundacional para a espiritualidade inaciana que é o “Apelo do Rei Temporal” (EE 91-98), Inácio nos convida a fazer uma oferta cheia de afeto e dizer: “Eu quero e desejo e é minha determinação deliberada imitar-vos…” (EE 98). Para crescer nessa comunhão com o Senhor, que é nosso desejo mais profundo, contemplação e discernimento, discernimento e contemplação, são indissociáveis… como são indissociáveis em uma pessoa autêntica seus sentimentos e atitudes mais profundas e os fatos de sua vida cotidiana. O discernimento nos Exercícios tem um caráter marcadamente cristológico (3) : enamorados de Cristo, em equipe com Ele e em diálogo com Ele (4) : é assim que temos que levar adiante nosso discernimento durante o tempo da Eleição.

No discernimento espiritual confluem três apelos do Evangelho: o apelo ao amor como dinâmica de fundo e motor da vida; o apelo à atenção com respeito à passagem e à presença constante de Deus na nossa vida humana; o apelo à vigilância com respeito às interferências que, desde fora ou desde dentro, nos podem tentar e afastar do caminho que o Espírito de Deus nos assinala. O discernimento evangélico é um movimento do amor. Do amor que deseja responder ao Amor. Como amar mais? Como amar em concreto, nas circunstâncias em que me encontro? Qual é para mim em cada âmbito da minha vida a decisão mais coerente com o amor (5) ? Eis a matéria da nossa oração durante o tempo da eleição!

O duplo discernimento: O primeiro discernimento deve assegurar se a moção causada é por ação do Espírito ou, ao contrário, o resultado de forças e potências naturais que atuam na pessoa. O segundo discernimento, que é o discernimento espiritual propriamente dito, trata de discernir as consolações que provêm do bom ou do mal espírito. Contudo, o segundo discernimento só pode ser feito depois de passar pelo primeiro. Portanto, é preciso fazer, em primeiro lugar, uma reflexão sobre os pensamentos, desejos e sentimentos que provêm de mim e são anteriores aos que vêm de fora (6) .

Na nossa oração, observemos a presença dos movimentos interiores (consolações e desolações). Eles são o eco positivo ou negativo da atitude que o sujeito mantém com relação às mais profundas exigências do seu ser. Manifestam os afetos ocultos que favorecem ou atrapalham o dinamismo existencial básico do homem orientado para Deus. Quando nos deixamos mover pelo Espírito de Deus esse dinamismo se encontraria favorecido positivamente, produzindo a consolação espiritual. Quando o coração está tomado pelos afetos desordenados contrários ao bom espírito, este pode produzir efeitos de tristeza ou aparente desolação (7) . Nesta etapa específica, o discernimento é focado em descobrir onde estamos sendo enganados pelo mau espírito quando buscamos a Vontade de Deus. O exercitante é chamado aqui a discernir onde se dão as falsas consolações (Cf. EE 332) (8) .

O discernimento evangélico é um movimento do amor. Do amor que deseja responder ao Amor. Como amar mais? Como amar em concreto, nas circunstâncias sociais e pessoais nas quais estou? Qual é para mim em cada âmbito de minha vida a decisão mais coerente com o amor? É o amor que busca a máxima fineza e a máxima entrega: “Que fiz por Cristo, que faço por Cristo e que farei por Cristo?” (EE 53). Sabendo que a minha resposta que mais me identifique com o Amor de Deus será minha máxima plenitude, porque Deus quer minha plenitude e felicidade “com maior superabundância do que pedimos ou entendemos ”(9).

Paulo reza pelos cristãos de Filipos para que o amor deles “siga crescendo em conhecimento perfeito e em todo discernimento” (Fl 1,9). O discernimento se vive em um movimento de tensão para o melhor, em um impulso que leva a crescer e aprofundar no amor (10) .

1- Apud Aracy Cardoso, Caminho de oração, São Paulo: Paulinas 1978,30.
2- Luís González-Quevedo, Discernimento espiritual – As Regras Inacianas, São Paulo: Loyola 2013, 16.
3- Darío Mollá Llácer, El discernimiento, realidad humana y espiritual, Manresa 82 (2010) 9-10.
4- Cf. Teresa de Jesús Plaza, El discernimiento espiritual como actitud permanente, Manresa 82 (2010) 44-48.
5- Darío Molá Llácer, El discernimiento, realidad humana y espiritual, Manresa 82 (2010)
6- Krzysztof Dyrek, El concepto de moción desde la psicología, Manresa 91 (2019) 132.
7- Josef Vives, Vida cristiana y discernimiento, EIDES 40 (2004) 28.
8- Antonio T. Guillén, Los engaños en el discernimiento, Manresa 82 (2010) 19.
9- Deliberação dos primeiros padres. Original latim em Monumenta Historica Societatis Iesu vol. 63: Constitutiones I, Roma 1934, 1-7.
10- Josef Vives, Vida cristiana y discernimiento, EIDES 40 (2004) 17.

Pe. Alfredo Sampaio Costa SJ é professor e pesquisador no departamento de Teologia da FAJE

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