Pesquisar
Close this search box.

Vida longa ao SUS

advanced divider

Élio Gasda SJ

A saúde é um direito universal. Quem nunca precisou de um curativo, uma consulta médica, um exame laboratorial, um tratamento preventivo, um medicamento, uma vacina? Todos já passamos por um atendimento à saúde, mas nem todos temos dinheiro para pagar. Muitas vezes, como na parábola do Bom Samaritano, o pobre é abandonado. Menos pelo SUS.  É o maior sistema de saúde pública do mundo! 

No Brasil, depois de duas décadas de pressão dos movimentos sociais por direito de todos à saúde nasceu o Sistema Único de Saúde (SUS). A Constituição de 1988, em seu artigo 196, prevê que a saúde é um direito de todos e dever do Estado. O acesso universal e gratuito foi regulamentando em 1990. “Nos tornamos o único país com mais de 100 milhões de habitantes que ousou oferecer saúde para todos” (Drauzio Varella). Dados do IBGE indicam que 71,5% da população, ou seja 7 em cada dez brasileiros, dependem do SUS (levantamento realizado antes da pandemia).

Usamos o SUS o tempo todo! O SUS é um avanço, apesar das tentativas de desmantelamento promovido pelo descaso com hospitais, unidades de saúde e desvalorização dos profissionais. Reconhecer constitucionalmente a saúde como direito de todos exige investimento do Estado em políticas públicas em favor da vida.

Infelizmente, os dois últimos governos estão na contramão da Constituição. Em 2017, a emenda constitucional 95 congelou por 20 anos as despesas com gastos em políticas públicas de saúde. O setor já perdeu mais de R$20 bilhões desde a vigência da emenda. Em 2020, Bolsonaro, por meio de decreto, tentou dar início a privatização do SUS, mas não obteve sucesso. Também suspendeu o Censo Demográfico realizado a cada dez anos pelo IBGE. Esse ano, o corte de 97% no orçamento inviabiliza a execução da pesquisa e coloca em risco todas as políticas públicas. Esse mesmo governo ‘assentou’, por quase um ano, em cima de um ‘cheque’ de R$ 20 bilhões que deveria ser destinado a compra de vacinas. Necropolítica! O SUS não pertence a governos ou partidos, é uma política de Estado.

A pandemia trouxe duas realidades sobre o SUS. Por um lado, mostrou o alto nível de eficácia no enfrentamento à crise sanitária, apesar do boicote bolsonarista. Também o quanto os profissionais de saúde são comprometidos com seu trabalho a favor da vida. Por outro, revelou o quanto o direito à saúde dos pobres é violado. Equipamentos sucateados, falta de medicamentos, de oxigênio, de kits de intubação, de vagas em UTI e de vacina. A morte não pode ser naturalizada, “pois desejo misericórdia e não sacrifícios; conhecimento de Deus e não holocausto” (Os 6,6). Já são mais de 412 mil mortos pela covid-19.

Saúde é sinal do Reino de Deus presente no mundo. O termo vem do latim, salus que significa salvação, conservação da vida. A saúde é uma benção divina. A natureza oferece elementos para a cura: “O senhor fez a terra produzir medicamentos: o homem sensato não os despreza” (Eclo 38,4). O profissional de saúde é um dom de Deus: “Honra o médico por causa da necessidade, pois foi o altíssimo quem o criou” (Eclo 38,1).

Os interesses do poderosos desprezam até o plano de Deus para que todos tenham vida. É preciso denunciar o sistema que mata os pobres. “Que direito tendes de esmagar o meu povo e moer a face dos pobres?” (Is 3,15). A doença não é castigo de Deus. Jesus denunciava os poderosos e promovia a saúde integral: “Não são os que têm saúde que precisam de médico, mas os doentes. Eu não vim chamar os justos, mas os pecadores” (Lc 2,17). Jesus contestou a tese da doença como resultado do pecado: “… Rabi quem pecou, …para que nascesse cego? …Nem ele nem seus pais” (Jo 9, 2-3). Jesus curou cegos, aleijados, leprosos, paralíticos, hemorragias. Jesus foi tão profundamente humano que sempre se pôs do lado da vida, vencendo as forças da morte. Evangelho para um enfermo é o restabelecimento da saúde.

A necessidade básica primeira é a vida. Salvar o SUS da mão dos poderosos, gananciosos e corruptos é ser discípulo de Jesus, é ser um bom samaritano: “Quem é o meu próximo?” (Lc 10,29).

Cuidar da saúde das pessoas é viver a fé no Deus da vida. E cuidar dos doentes é cuidar do próprio Cristo: “Estive doente e cuidaste de Mim” (Mt 25, 36).

Sem o SUS, a maioria dos brasileiros não teria acesso a um sistema de saúde. Curar enfermidades, aliviar sofrimentos. Vida longa ao SUS!

Élio Gasda SJ é professor e pesquisador do Departamento de Teologia da FAJE

Fonte: https://domtotal.com/noticia/1514383/2021/05/vida-longa-ao-sus/

...