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Serra do Curral: “Em nome de Deus, defendam a Mãe Terra” (Papa Francisco)

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Élio Gasda SJ

O Direito Administrativo que disciplina o exercício da função administrativa do Estado é construído sobre alguns pilares, entre eles a primazia do interesse público sobre o privado. O governador Romeu Zema e seus secretários diferenciam interesse público do privado?

Esta semana o Brasil amanheceu em choque. Vergonha! Absurdo! Na madrugada de 30 de abril, o governo do estado, por meio dos seus representantes e aliados (FIEMG) no Conselho Estadual de Política Ambiental (COPAM) autorizou, por 8 votos a 4, a destruição de um PATRIMÔNIO PÚBLICO em defesa de INTERESSES ECONÔMICOS: o licenciamento para exploração da Serra do Curral pela empresa Taquaril Mineradora S/A. A Tamisa poderá explorar uma área de 41,27 hectares da Serra por 13 anos. Oito fantoches da mineração, sem nenhum compromisso com o patrimônio público, condenaram a Serra do Curral. Votos a favor da destruição. Estupidez tem nome.

Governado por um inimigo da natureza, Minas Gerais atravessa a pior crise ambiental da história. A Serra do Curral é um importantíssimo componente histórico, cultural e ambiental de Belo Horizonte. E deveria ter mesma importância para os municípios vizinhos. E para o Brasil. Os 11 km de curvas montanhosas e seus 1390 metros de altitude emolduram a Capital Mineira, preservam a biodiversidade da Mata Atlântica e do Cerrado. Há milhões de anos a Serra resiste e encanta!

Desde os tempos da Fazenda do Cerrado, fundada em 1701, pelo bandeirante João Leite Ortiz, até a construção da nova capital, a Serra do Curral oferece excelente condição climática à região. O pico Belo Horizonte, o mais alto da cidade, está estampado no Brasão do Município.

O conjunto paisagístico da Serra do Curral é tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) desde 1960. Em 2004, o Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural do Município de Belo Horizonte teve o mesmo entendimento. O processo de tombamento em nível estadual está em andamento desde 2018. O processo por si só já inviabilizaria a aprovação de licenciamento concedido à Tamisa. De acordo com o decreto federal 25, Art. 10, de 1937, quando se inicia um processo, o bem é tombado provisoriamente. Em 2019 o Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (IEPHA) iniciou o dossiê sobre o tombamento.

Além da biodiversidade, o local abriga nascentes, possui cavidades espeleológicas, é parte de unidades de conservação, possui vestígios de sítios arqueológicos, quatro já cadastrados. A Serra é um dos geossítios selecionados para a criação do Geoparque Quadrilátero Ferrífero (categoria UNESCO). Geossítios são elementos do patrimônio geológico de valor científico, cuja identificação passa por critérios de representatividade, integridade e raridade. Por que Zema retarda o processo de tombamento que aguarda reunião do Conselho Estadual de Patrimônio Cultural de Minas Gerais (Conep -MG)?

O capitalismo traz as marcas da destruição da natureza. Para quem ainda duvidava, “essa economia mata” (Evangelii gaudium, 53). Quem poderá frear a ganância das mineradoras? A mineração predatória é destinada exclusivamente ao lucro de acionistas. Não há compromisso com a população e com o meio ambiente. Poucos enriquecem destruindo uma natureza que é de todos. Mineradoras lucram sobre cadáveres dos trabalhadores.

A mineração predatória potencializa a destruição. Estes que colocam um preço na Serra do Curral são partidários desta ditadura da economia (Evangelii gaudium, 55). Não há restrições morais à perversidade. Sacrificam um estado inteiro, um pais inteiro. Sem remorso algum, fazem da vida de milhões de pessoas um verdadeiro inferno. Ferozes, implacáveis, estúpidos. É uma tragédia atrás da outra. Governos, acionistas e empresários de mineradoras tem sangue nas mãos.

É pecado ecológico! “Aquele que ama o dinheiro dificilmente escapa do pecado” (Eclesiástico 31,5). Para o cristão, a defesa da criação presente na Serra do Curral é exigência de fé. Tudo quanto agride a terra, agride os filhos de Deus. Devastar a Serra do Curral é violar a obra de Deus. A mineração mata! Por trás de tanto sofrimento, morte e destruição, sente-se o cheiro daquilo que São Basílio chamava de esterco do diabo: reina a ambição desenfreada de dinheiro” (Papa Francisco).

Se a sociedade não reagir, não haverá “Serra do Curral”. Mas a reação deve ser forte: Basta! É preciso pôr um fim à tamanha insanidade. A mobilização popular em defesa da Serra do Curral é a única forma de interromper o rolo compressor do Estado e das empresas sobre o meio ambiente.

Que o presságio de Mauricio Tizumba não se cumpra “Eu vejo a serra do Curral descendo estrada dentro de um caminhão”.

A Serra do Curral não é uma mercadoria! A Serra do Curral não está à venda!

 

Élio Gasda SJ é professor e pesquisador no departamento de Teologia da FAJE

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