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O enfrentamento da pandemia é um problema biopolítico?

Elton Vitoriano Ribeiro SJ

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As palavras e expressões que passaram a fazer parte de nosso vocabulário desde o início da pandemia representam muito bem a situação singular em que vivemos. Prestar atenção aos nossos vocabulários, seus usos e seus limites, é tomar consciência de nosso mundo e de nós mesmos. Isso porque, segundo Wittgenstein, os limites da minha linguagem denotam os limites do meu mundo.

Ora, nossa linguagem atual sofre, em seus vocabulários, um rápido e continuo processo de transformação porque o nosso mundo, hoje, está em um processo acelerado de transformação. A causa de tudo isso é a pandemia da Covid-19. Mas, como somos animais de linguagem que se autointerpretam por narrativas, surge a questão: como estamos narrando socialmente essa pandemia? Ainda: o que a pandemia significa e significará em nossas vidas e na vida da humanidade? Pensar o futuro é um exercício arriscado e, na maioria das vezes, fadado ao fracasso. Então, urge pensar o presente, sabendo da labilidade e da fragilidade de nossa tarefa.

Comecemos com o conceito de pandemia. Vivemos a traumática experiência de uma pandemia galopante e inesperada em nosso mundo globalizado. Pandemia (todo o povo) é um conceito que deriva do termo epidemia. Epidemia possui sua etimologia na junção dos termos epi e demos. O primeiro termo significa “sobre ou acima de”, o segundo “povo”. Filosoficamente, para Giorgio Agamben, “A epidemia, como sugere a etimologia do termo (demos é em grego o povo como corpo político e polemos epidemios é em Homero o nome da guerra civil) é acima de tudo um conceito político, que se prepara para tornar-se o novo terreno da política – ou da não política – mundial (A medicina como religião, 04/05/20 )”. Assim, lendo epidemia e pandemia como conceitos políticos, não basta tratarmos a situação atual, apenas, como um problema de medicina, de imunologia, de biologia; mas, propriamente, como um problema de política, ou melhor, de biopolítica.

O conceito de biopolítica possui uma interpretação rica e variada. De forma breve, podemos dizer que biopolítica é um conceito filosófico contemporâneo que abarca uma grande família de fenômenos políticos modernos nos quais está envolvida diretamente a vida humana. Basicamente, esses fenômenos são articulados ao redor de questões que se preocupam com a gestão da vida biológica, com programas de proteção e melhoria da vida, com a produção do humano e a domesticação da vida, e com a vida como objeto da política.

Esse conceito ganhou cidadania na reflexão política quando foi usado por Michel Foucault em 1972 ao estudar “O nascimento da Medicina Social”. A partir dessa análise, o corpo humano é interpretado como uma realidade biopolítica onde a medicina passa a ser compreendida como uma estratégia biopolítica. A tarefa política passa a ser, nessa interpretação, a tarefa de gerir a vida nas sociedades de várias formas: o disciplinamento e adestramento dos corpos para o trabalho, os controles reguladores do nascimento, mortalidade, longevidade, e a própria saúde da população passam a ser elementos de preocupação e controle políticos.

Nas sociedades contemporâneas, para vários pensadores, a biopolítica é a forma de governar as sociedades, os grupos políticos e ideológicos, e a vida das pessoas. Isso acontece por meio do controle das dinâmicas socioculturais e econômicas que possuem a finalidade de captura da vida e, dominando a natureza, melhorar a vida humana. Biomedicina, biotecnologia, biocapitalismo e bioeconomia, são alguns exemplos de dispositivos de controle social da vida. Intervenções tecnológicas na vida, valorização econômica da vida e promessa de saúde, bem-estar e qualidade de vida, são seus resultados biopolíticos. Alguns pensadores ousam dizer que nós, sujeitos contemporâneos, já somos sujeitos biopolíticos dóceis, obedientes e manipuláveis. O poder biopolítico já faz parte do que somos, da constituição de nossa subjetividade, de nossas culturas e de nossas sociedades.

Penso que agora fica mais fácil entender e explicar a afirmação, feita no final do ano passado, pelo diretor geral da Organização Mundial da Saúde (OMS) Tedros Adhanom Ghebreyesus. O diretor afirmou: “Eu esperava que o Brasil pudesse ter um melhor desempenho em pandemias por causa de seu forte sistema de vigilância em saúde” (Jornal O Estado de Minas, As vacinas brasileiras, 27/03/21). Ora, caríssimo senhor diretor, o enfrentamento da pandemia é um problema biopolítico como inferimos em sua afirmação. Sistemas biopolíticos, em sua gestão de políticas sanitárias públicas, estão diretamente vinculados aos governos e suas estratégias políticas de gestão. Nesse caso, o Brasil está em maus lençóis, e o reflexo disso é este galopante e terrível desenvolvimentos da pandemia de Covid-19 entre nós. Mas, se o problema é biopolítico, talvez melhor que pandemia, o conceito para elucidar nossa situação atual seja o de sindemia. Mas isso é outra história.

Elton Vitoriano Ribeiro SJ é professor e pesquisador no departamento de Filosofia, e reitor da FAJE

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