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Paulo Freire: amo as gentes, amo o mundo

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Élio Gasda SJ

Não é possível falar de educação sem conhecer Paulo Freire. Autor de 25 livros, é o terceiro intelectual da área de humanidades mais citado do mundo.
Compreender Paulo Freire é fundamental em tempos digitais, globalizado, pandêmico e sombrios. Não basta memorizar datas, fórmulas, anatomia do corpo humano, sinônimos, antônimos, preposições. Em um click, tudo está na internet. É preciso pensamento crítico. Aprender a ler o mundo!

Educação não é mercadoria! O objetivo maior da educação é conscientizar o estudante para transformar a realidade. O método de alfabetização de Paulo Freire partia da escolha de palavras do cotidiano dos alunos. “A leitura do mundo precede a leitura da palavra, daí que posterior leitura desta não possa prescindir da continuidade da leitura daquela” (Paulo Freire).

Compartilhar o mundo lido. É preciso que as palavras aprendidas dialoguem com a vida real e com as experiências de cada aluno. Tijolo nos remete a casa, ao direito de moradia. A partir daí se formam discussões em torno do tema. Problemas reais de moradia exigem soluções possíveis.
Foi em 1963, na cidade de Angicos (RN) que o método freireano ganhou o mundo. Observados por jornalistas e pedagogos, tanto nacionais quanto internacionais, o método alfabetizou 300 adultos em 40 horas. Assim, começava no Brasil a defesa de uma educação para além da alfabetização. Educação como ferramenta conscientizadora do povo. Educação para cidadania, para criação de organizações populares capazes de transformar a sociedade. Educar é ato político!

Depois da difusão do método de Freire, o Brasil derrubou taxas altíssimas de analfabetismo. A escola é um espaço de transformação social. “Seria uma atitude ingênua esperar que as classes dominantes desenvolvessem uma forma de educação que proporcionasse às classes dominadas perceber as injustiças sociais de maneira crítica” (Paulo Freire). Em 1964 Paulo Freire foi preso, julgado como subversivo comunista! Foi condenado ao exílio pela ditadura militar.
Com sua pedagogia a tira colo, Freire percorreu mais de 50 países. Foi doutor honoris causa de 35 universidades ao redor do planeta. Foi professor na Unicamp, na PUC/SP, na universidade de Genebra, em Harvard, Cambridge e Massachussets. Sua “pedagogia do oprimido”, traduzida em 17 idiomas, é uma das melhores obras produzidas no Brasil.

As pessoas precisam ser respeitadas em suas realidades. “Ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, nos educamos entre nós, mediatizados pelo mundo”. De fato, “Paulo Freire ensinou, acima de tudo, que precisamos aprender a ouvir, a entender e a respeitar uns aos outros” (Douglas J. Simpson).
Paulo Freire era profundo humanista: “Amo as gentes e amo o mundo. E porque amo as pessoas e amo o mundo, luto para que a justiça social se implante antes da caridade”. Sem formação da consciência crítica, não há possibilidade de superação da injustiça social. Formar pessoas melhores é um jeito de fazer um mundo mais fraterno. “Educação é um ato de amor” (Paulo Freire).

Freire enraivece fascistas e ditadores inimigos da educação. Sua pedagogia é revolucionária. Seu conhecimento ajuda a transformar a realidade. Por isso a elite brasileira tem tanto receio à Paulo Freire. Como em 1964, o governo tenta, a todo custo, destruir o seu legado: “Entrar com um lança-chamas no MEC para tirar o Paulo Freire de lá” (Jair Bolsonaro).

“Se a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda” declarou Paulo Freire. No Brasil, não há mais políticas públicas para educação.

É preciso conscientizar, estimular o pensamento e utilizá-los na vida cotidiana. A primeira prática libertadora é a educação. Onde há poder, deve haver resistência. Aprender a pensar é começar a resistir, pois este é o início da subversão.
A pedagogia tem uma função insurrecional. O grande objetivo é a participação ativa na recuperação da humanidade negada aos milhões de descartados e explorados. Sócrates dizia que “só é útil o conhecimento que nos torna melhores”. A função da pedagogia é formar sujeitos que produzam conhecimentos que transformem o mundo.

A identidade cristã de Paulo Freire se reflete em sua vida e em seus escritos: “O cristianismo é para mim, uma doutrina maravilhosa. Embora digam que sou um líder comunista (…) Eu nunca tive a intenção de deixar de ser, de “estar sendo”, católico. Não senti qualquer necessidade de abandonar a Igreja ou deixar minhas convicções cristãs. Assumo apaixonadamente, corporalmente, fisicamente, com todo o meu ser, uma postura cristã porque essa me parece plenamente revolucionária, plenamente humanista, plenamente libertadora”.

Em nome da justiça social, estava aberto ao diálogo. “Minhas reuniões com Marx nunca me sugeriram que parasse de ter reuniões com Cristo” (Paulo Freire).
Que Paulo Freire nos ensine a nunca perder a esperança nestes momentos tão angustiantes e tristes. Sua memória nunca deixou de ser tão necessária! Que ele viva em cada educador, em cada um de nós!

Élio Gasda SJ é professor e pesquisador no departamento de Teologia da FAJE

Artigo publicado originalmente em https://domtotal.com/noticia/1540698/2021/09/paulo-freire-amo-as-gentes-amo-o-mundo/

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